Friday, October 05, 2007

Ela cultiva flores mortas, murchas, quase secas. Ainda tem esperança de arrancar-lhes algo de vida. Mas ela não percebe que estão mortas, não vê que tem que partir, que sumir, que vomitar tudo aquilo que engoliu. Ela vai da casa ao trabalho, do trabalho para casa, na sua frustrante jornada diária. Reclama, reclama, a todo momento. Chora, liga pro namorado, ele também não sabe muito o que dizer. Ele sabe puxá-la pra junto dele, fazer dela um cachorrinho. Ela aceita. São as flores mortas. O cheiro já não agrada, lembra velório, cemitério. Mas não adianta dizer, ela não quer saber, não quer sentir. Quer apenas seguir reclamando. Pensar que fiz parte disso um dia me apavora. Tão linda, tão jovem e perdendo a vida num lugar onde todos já morreram.

1 comment:

R. said...

Flores mortas. Gostei disso. Lembrou-me a uma foto em p&b que tirei, certa vez, de um vaso com flores esturricadas. Ao fundo, a foto de um idoso olhando melancolicamente o movimento de uma galeria. Era a foto de uma foto, pois. E deveras significativa.